Luiiz G. Darrigo Jr.1, Mauro
Geller2,Aguinaldo Bonalumi Filho3, David R.
Azulay4
Objetivo: Avaliar a prevalência de neurofibroma plexiforme em
rianças e adolescentes com neurofibromatose tipo 1 e seu potencial
e transformação maligna.
Artigo 13 - Prevalence of plexiform
neurofibroma in children and adolescents with type I
neurofibromatosis
Luiz G. Darrigo Jr.1, Mauro Geller2,Aguinaldo Bonalumi Filho3,
David R. Azulay4
Objetivo:
Avaliar a prevalência de neurofibroma plexiforme em crianças e
adolescentes com neurofibromatose tipo 1 e seu potencial de
transformação maligna.
Métodos: Estudo retrospectivo realizado através da
análise do banco de dados do Centro Nacional de Neurofibromatose,
coletado nos seguintes serviços de referência entre 1996 e 2004:
Instituto de Dermatologia Prof. Rubem David Azulay da Santa Casa de
Misericórdia do Rio de Janeiro, Instituto de Pediatria e
Puericultura Martagão Gesteira da Universidade Federal do Rio de
Janeiro e Departamento de Imunologia e Microbiologia da Faculdade
de Medicina de Teresópolis.
Resultados: Nesse período, foramatendidos 104
pacientescom idade de 1 a 17 anos e diagnóstico clínico de
neurofibromatose tipo 1, sendo 53 do sexo masculino e 51 do sexo
feminino. Destes, 28 pacientes (15 masculinos e 13 femininos)
apresentaram neurofibroma plexiforme (26,9%). Divididos por faixa
etária, observou-se 21,42% (seis) entre 1 e 5 anos; 35,71% (10)
entre 6 e 12 anos e 42,85% (12) entre 13 e 17 anos. Dos 104
pacientes estudados, dois evoluíram para tumor maligno da bainha do
nervo periférico (1,92%).
Conclusões: Os neurofibromas plexiformes são
manifestações relativamente comuns em pacientes com
neurofibromatose tipo 1 e podem ser causa de aumento significativo
da morbimortalidade entre os pacientes. Concluímos, em nosso
estudo, que a freqüência de neurofibroma plexiforme e de seu
potencial de malignização na população observada estáemconformidade
com dados da literatura internacional.
J Pediatr (Rio J). 2007;83(6):571-573: Neurofibromatose 1,
neurofibroma plexiforme, prevalência.
Abstract
Objective:
To assess prevalence of plexiform
neurofibroma in children and adolescents with type I
neurofibromatosis and its malignant potential.
Methods: A retrospective studywas conducted
through analysis of the database at Centro Nacional de
Neurofibromatose [Brazilian Neurofibromatosis Center], collected
from the following reference services between 1996 and 2004:
Instituto de Dermatologia Prof.
Rubem David Azulay da Santa Casa de Misericórdia do Rio de Janeiro,
Instituto de Pediatria e Puericultura Martagão Gesteira da
Universidade Federal do Rio de Janeiro and Department of
Immunology and Microbiology at Faculdade de Medicina de
Teresópolis.
Results: Over that period, 104 patients aged
between 1-17 years were admitted with clinical diagnosis of type I
neurofibromatosis. Of these, 53 were male and 51 were female,
and
28 patients (15 male and 13 female) had plexiform neurofibroma
(26.9%). Division by age group resulted in 21.42% (six) between 1-5
years; 35.71% (10) between 6-12 years and 42.85% (12) between 13-17
years. Of the 104 patients, two developed a
malignant peripheral nerve sheath tumor (1.92%).
Conclusions: Plexiform neurofibromas are
relatively common manifestations in patients with type I
neurofibromatosis andmay be a cause of significant increase in
morbidity and mortality among patients. In this study, we conclude
that frequency of plexiform neurofibroma and its malignant
potential in the population studied is in agreement with data from
the international literature.
J Pediatr (Rio J). 2007;83(6):571-573: Type I neurofibromatosis,
plexiform neurofibroma, prevalence.
1. Residente em Pediatria, Hospital do Servidor Público Municipal
de São Paulo, São Paulo, SP. Especializando em Pediatria Clínica,
Universidade de São Paulo
(USP), São Paulo, SP.
2. Professor titular, Faculdade de Medicina, Fundação Educacional
Serra dos Órgãos (FESO), Teresópolis, RJ. Membro, Conselho Diretor,
International Neurofibromatosis
Association.
3. Professor, Pós-Graduação em Dermatologia, Hospital Naval
Marcílio Dias, Rio de Janeiro, RJ.
4. Chefe de Serviço, Instituto de Dermatologia Professor Rubem
David Azulay, Santa Casa de Misericórdia do Rio de Janeiro, Rio de
Janeiro, RJ. Professor,
Fundação Técnico-Educacional Souza Marques, Pontifícia Universidade
Católica (PUC) e Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Rio
de Janeiro, RJ.
Este estudo foi realizado no Centro Nacional de Neurofibromatose
(CNNF), Rio de Janeiro, RJ. Serviços de referência: Instituto de
Dermatologia Professor
Rubem David Azulay, Santa Casa de Misericórdia do Rio de Janeiro;
Instituto de Pediatria e Puericultura Martagão Gesteira
Universidade Federal do Rio de
Janeiro; Departamento de Imunologia e Microbiologia, Faculdade de
Medicina de Teresópolis.
Não foram declarados conflitos de interesse associados à publicação
deste artigo.
Como citar este artigo: Darrigo Jr. LG, Geller M, Bonalumi Filho A,
Azulay DR. Prevalence of plexiform neurofibroma in children and
adolescents with type I
neurofibromatosis. J Pediatr (Rio J).
2007;83(6):571-573.
Artigo submetido em 07.03.07, aceito em
30.05.07.
doi:10.2223/JPED.1718
571
Introdução
A neurofibromatose tipo 1 (NF1) é uma desordem genética
multissistêmica que apresenta importantes manifestações cutâneas,
como manchas café-com-leite, efélides e
neurofibromas1,2. A NF1 é considerada a mutação autossômica
dominante espontânea “nova” mais comum nos seres humanos,
apresentando completa penetrância, apesar de
possuir expressão variável1,3,4. A incidência de NF1 é de
aproximadamente
1:2.500 novos nascimentos, incidindoemtodas as raças e possuindo
correlação idêntica entre homens e mulheres1. A estimativa é de que
existam hoje, no Brasil, cerca de 80.000 casos e, no mundo, cerca
de 1,5 milhões de casos de NF15.
A NF1 foi descrita em 1882 por Friedrich Daniel Von Recklinghausen,
que sugeriu o nome de neurofibroma para os tumores do tecido neural
presentes nesta patologia e neurofibromatose
para a condiçãocommúltiplos neurofibromas6.
O diagnóstico da NF1, cujos critérios foram estabelecidos pelo
National Institutes of Health (NIH) em 1987 e atualizados em 1997
(Tabela 1), depende de um exame clínico cuidadoso
do paciente, de seus pais e irmãos e de uma história familial
detalhada, incluindo informações clínicas e, algumas vezes, exames
complementares7,8.
Os critérios do NIH podem ser insuficientes para o diagnóstico de
NF1 em crianças que representam o único caso na família e exibem
apenas manchas café-com-leite, sem outras
manifestações. Neste caso, recomenda-se o acompanhamento anual do
caso suspeito, podendo-se utilizar a hibridização in situ de
fluorescência (FISH) e a técnica de análise direta da mutação no
DNA para esclarecer possíveis dúvidas diagnósticas ou simplesmente
para auxiliar o diagnóstico mais precocemente9. Ao contrário,
aquelas que herdam a doença de um dos progenitores podem geralmente
ser identificadas durante o primeiro ano de vida, porque o
diagnóstico requer apenas uma característica adicional, além da
história familial
positiva7.
O neurofibroma plexiforme (NP), também chamado de neuroma
plexiforme, paquidermatocele ou elefantíase neurofibromatosa, é
classificado comoumtumor benigno da bainha
dos nervos periféricos que envolvem múltiplos fascículos
nervosos5,10. É umtumor não-metastático, altamente vascularizado,
de crescimento lento e localmente invasivo5. Os NP
constituem uma das complicações significativas da NF1, que podem
ocorrer durante a infância e raramente se desenvolvem depois da
adolescência. Os NP podem originar tumores malignos da bainha do
nervo periférico (MPNST), o que ocorre em 2-5% dos pacientes com
plexiforme5. Os MPNST, anteriormente referidos como
neurofibrossarcomas ou schwannomas malignos, constituem a principal
causa de morte e a neoplasia mais comum nesse grupo5.
O objetivo deste estudo é avaliar a prevalência de NP em crianças e
adolescentes com NF1, assim como o potencial de transformação
maligna destes neurofibromas.
Métodos Observações constantes do banco de dados do Centro Nacional
de Neurofibromatose (CNNF), coletado nos seguintes serviços de
referência entre 1996 e 2004: Instituto de Dermatologia Professor
Rubem David Azulay da Santa Casa de Misericórdia do Rio de Janeiro,
Instituto de Pediatria e Puericultura Martagão Gesteira da
Universidade Federal do Rio de
Janeiro e Departamento de Imunologia e Microbiologia da Faculdade
de Medicina de Teresópolis. Neste período, foram atendidos 104
pacientes com idade entre1e17anos. Os pacientes atendidos pelo CNNF
são de diferentes estados brasileiros, e alguns são oriundos de
países vizinhos, como Uruguai, Peru, Bolívia e México. Todos os
pacientes foram
atendidos por pelo menosumdos autores, sendo feito o diagnóstico
clínico de NF1 segundo os critérios clínicos postulado pela NIH
Consensus Conference.
O trabalho foi aprovado pelo Comitê de Ética Médica da
UNIFESO.
Resultados Dos 104 pacientescommenos de 17 anos analisados,
tivemos 53 do sexo masculino e 51 do sexo feminino, demonstrando
uma eqüidade entre os sexos. Destes, 28 pacientes (26,9%), 15
masculinos e 13 femininos, apresentaram NP, estando os dados de
acordo com alguns estudos que relatam prevalência de 15%;
entretanto, outros apontam prevalência de 16 a 40% em pacientes com
NF111. Em outro estudo, Huson et al. encontrarampresença de NP
evidentes ao exame físico em 32% dos pacientes com NF111.
Divididos por faixa etária, observou-se 21,42% (seis) entre 1 e 5
anos; 35,71% (10) entre 6 e 12 anos e 42,85% Tabela 1 - Critérios
diagnósticos da neurofibromatose tipo 1 (NIH, 1990)* Seis ou mais
manchas café-com-leite>5mmde extensão em pacientes na
pré-puberdade ou > 15 mm em pacientes na póspuberdade Dois ou
mais neurofibromas de qualquer tipo ou um eurofibroma plexiforme
Efélides nas regiões axilares ou inguinais Glioma óptico Dois ou
mais nódulos de Lisch.
Uma lesão óssea característica, como displasia do osso esfenóide ou
afilamento dos ossos longos do córtex, com ou sem
pseudo-artroses.
Quadro incompleto, porém possuindo um parente em primeiro grau
(pai, irmão ou filho) que satisfaça os critérios do NIH NIH =
National Institutes of Health.
* Dois ou mais dos critérios assinalados são necessários para
confirmação
diagnóstica.
572 Jornal de Pediatria - Vol. 83, Nº 6, 2007 Neurofibromas
plexiformes em crianças e adolescentes - Darrigo Jr. LG et
al.
(12) entre 13 e 17 anos. Em nosso estudo, dois pacientes (1,92%)
evoluíram com MPNST.
Discussão
Embora freqüente em pacientes com NF1, os NP não são um achado
patognomônico dessa síndrome12. Os NP constituem uma causa
importante de complicações clínicas na NF1
e desenvolvem-se principalmente na infância e adolescência.
Sua localização mais comum é no tronco (43%), seguido pela cabeça e
pescoço (42%) e extremidades (15%)13.OsNP apresentam uma história
natural muito variável, pois algumas
lesões podem se manter quiescentes por longo período, ao passo que
outras podem crescer agressivamente, sobretudo durante a infância e
adolescência. Os NP necessitam de
acompanhamento clínico5,10, que deve ser realizado anualmente
através de exames clínicos e de imagem, como raio X, tomografia
computadorizada (TC) e ressonância magnética
(RM), sendo este último considerado padrão-ouro. A RMdeve ser usada
não apenas para localizar o NP, mas também para medi-lo, sendo este
dado útil no acompanhamento do
paciente5.
Durante o acompanhamento, deve-se estar alerta para a ocorrência de
crescimento ou dor nos plexiformes, o que sugere uma transformação
maligna. Nestes casos, indica-se a biópsia do tumor1,5,9. Outra
ferramenta laboratorial que se encontra disponível para a detecção
dos MPNST é a tomografia por emissão de pósitrons (PET) com análogo
de glicose F-fluorodeoxiglicose (FDG). Trata-se de uma técnica que
permite a visualização e a quantificação do metabolismo da glicose
nas células e reflete o aumento do metabolismo dos tumores
malignos5. O risco de desenvolvimento de MPNST tem sido estimado
entre 2-5%1,5, sendo nestes casos extremamente agressivos com
prognóstico reservado (sobrevida de 5 anos em 34-52%)1,5. Outros
processos neoplásicos menos freqüentes incluem glioma óptico,
astrocitoma, feocromocitoma, rabdomiossarcoma e leucemia mielóide
crônica juvenil5. Nestes casos, o tratamento deverá ser igual ao
realizado em crianças com neoplasia e sem NF114.
Os NP podem ser tratados cirurgicamente, apesar de os resultados
serem freqüentemente insatisfatórios, visto que se envolvem
intimamente com os nervos, e em razão de sua tendência a
recidivar1. Fatores prognósticos para recidiva são: ter menos de 10
anos de idade na cirurgia inicial, presença de tumor inicial após a
cirurgia e local do tumor (cabeça e
pescoço)5.
Friedrich et al. sugerem que intervenções cirúrgicas precoces em NP
de pequeno tamanho em crianças podem ser vantajosas, especialmente
na estratégia de prevenção da progressão dos mesmos15. Desta forma,
a precocidade do diagnóstico deumapossível transformação maligna
acompanhada de ressecção cirúrgica pode alterar positivamente o
prognóstico.
Os NP podem ser sintomáticos já ao nascer ou se tornarem
sintomáticos ao longo do tempo. A precocidade do surgimento apóia a
idéia de que os NP são lesões congênitas, embora possa haver
pacientes que desenvolvam os plexiformes após os 20 anos de
idade5.
NP são manifestações relativamente comuns em pacientes com NF1 e
podem ser causa de aumento significativo da morbimortalidade entre
os pacientes5.
Concluímos que a freqüência de NP na população observada está em
conformidade com dados da literatura internacional13.
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type 1 children. World J Surg Oncol. 2005;3:6.
Correspondência:
Luiz Guilherme Darrigo
Junior
Rua Martiniano de Carvalho, 1049, Paraíso
CEP 01321001 – São Paulo, SP
Tel.: (12) 9151.6435
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